SECRETARIA DE SEGURANÇA PÚBLICA
URBANA E TRÂNSITO DE SANTO ANDRÉ
Departamento de Planejamento e Operações de Segurança
Conceito de Algema:
A palavra algema vem do árabe al-djamia, que significa "a pulseira". O dicionário jurídico da Academia Brasileira de Letras Jurídicas anota a palavra algema como: "Algema... pulseira de ferro empregada para manietar alguém a fim de dificultar sua fuga quando em transporte fora do lugar de confinamento...".
Na mídia de forma geral, e na televisiva em particular, tornaram-se lugar comum à apresentação de pessoas presas provisoriamente algemadas, ferindo desta forma, os direitos básicos da pessoa humana.
O mesmo ocorre dentro dos Fóruns Criminais onde se vê um único policial militar conduzindo, por vezes, três ou mais pessoas encarceradas algemadas umas às outras de forma que mal podem se locomover.
Não há dúvidas que a utilização deste aparato (algema), em certas circunstâncias, se faz necessário, contudo não o pode ser feito de forma indiscriminada e sem qualquer critério.
A correta utilização das algemas é um tema pouco debatido pelos operadores do direito, há o acatamento de seu uso freqüente quando: da prisão em flagrante de alguma pessoa, quando da condução e apresentação de algum acusado preso provisoriamente à autoridade competente, na apresentação ao delegado de polícia, em caso de flagrante, ou para uma averiguação devidamente fundamentada.
Os poucos doutrinadores que se pronunciaram sobre o tema aduzem que a dificuldade enfrentada reside no disposto na Lei de Execução Penal em seu artigo 199, onde narra: “O emprego de algemas será disciplinado por decreto federal”. Mas, todavia até hoje não temos esse decreto federal que cuide da matéria citada.
Contudo, no Estado de São Paulo o uso de algemas está disciplinado pela Resolução da Secretaria de Segurança Pública – Res. SSP-41, publicada no Diário Oficial do Estado de São Paulo aos 02 de maio de 1983, e pelo Decreto n.º 19.903 de 30 de outubro de 1950 que dispõe estar autorizado o emprego da algema.
O Decreto supracitado possibilita a utilização da algema, em casos muitos restritos, tais como:
1) – para conduzir à presença da autoridade os delinqüentes presos em flagrante, desde que ofereçam resistência, ou tentem fuga; (amparado, inclusive, pelo artigo 284 do CPP);
2) – para conduzir à presença da autoridade, os ébrios, viciosos e turbulentos, colhidos na prática da infração, e que devem ser postos em custódia, desde que seu estado extremo de exaltação torne indispensável o emprego da força moderada; e
3) – para transporte de uma pessoa para outra dependência; remoção de uma pessoa de um para outro presídio que pela conhecida periculosidade possa tentar a fuga durante a diligência ou tentando ou oferecido resistência, quanto de sua prisão.
Pelo exposto vemos que o emprego de algemas deve ser evitado, só podendo ser levado a efeito em casos singulares, quando houver inquestionável necessidade, não podendo a necessidade ser deduzida a partir da gravidade dos crimes nem da presunção de periculosidade do réu.
Desde logo cabe recordar que o uso de força física está excepcionalmente autorizado em alguns dispositivos legais do CPP, tais como:
(a) CPP, art. 284 ("Não será permitido o emprego de força, salvo a indispensável no caso de resistência ou de tentativa de fuga do preso");
(b) CPP, art. 292: ("Se houver, ainda que por parte de terceiros, resistência à prisão em flagrante ou à determinada por autoridade competente, o executor e as pessoas que o auxiliarem poderão usar dos meios necessários para defender-se ou para vencer a resistência, do que tudo se lavrará auto subscrito também por duas testemunhas.").
Já pelo que se sabe dos textos mencionados do CPP nota-se que a força é possível:
(a) quando indispensável no caso de resistência ou tentativa de fuga;
(b) quando o uso de força moderada for necessário para a defesa ou para vencer a resistência.
Importante se faz lembrar, que por força da Lei, os menores e desequilibrados mentais são isentos de culpa, sendo inimputáveis, portanto, não se dá a eles o mesmo tratamento do uso de algemas, cabendo para o demente o uso da camisa-de-força para sua condução.
Num caso prático de condução de demente, deve o Guarda Municipal, utilizar-se dos meios ao seu alcance para substituir a camisa-de-força, utilizando-se de um cobertor, faixas, ou outros meios para conter a pessoa, evitando que sofra qualquer lesão, quando em seu transporte.
A decisão do Superior Tribunal de Justiça:
"Uso de algemas. Avaliação da necessidade – A imposição do uso de algemas ao réu, por constituir afetação aos princípios de respeito à integridade física e moral do cidadão, deve ser aferida de modo cauteloso e diante de elementos concretos que demonstrem a periculosidade do acusado. Recurso provido". (RHC nº 5.663-SP, 6ª Turma, j. 19.87.1996, rel. Min. William Patterson, v.u., DJU 23.9.1996, pág. 35.157).
Devemos lembrar dos princípios da dignidade da pessoa humana, e da prevalência dos direitos humanos (Título I – Dos Princípios Fundamentais), da Constituição Federal, como segue:
Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
(...)
III - a dignidade da pessoa humana;
(...)
Art. 4º - A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:
(...)
II - prevalência dos direitos humanos;
(...)
VII – solução pacífica dos conflitos;
(...)
É obrigatório à observância pelos agentes públicos, em cumprimento de suas ações, dos fundamentos supracitados da Constituição Federal.
Deve-se ainda Ressaltar que o uso de algema de forma indiscriminada fere também o artigo 5º da Constituição Federal onde narra que:
Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante;
(...)
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
(...)
XLI – a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais;
(...)
XLIX - é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral;
(...)
LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;
(...)
O Código Penal em seu artigo 38, ao tratar das penas é também enfático, ao dispor que o preso conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade, impondo-se a todas as autoridades o respeito à sua integridade física e moral.
Direitos do preso:
Art. 38 - O preso conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade, impondo-se a todas as autoridades o respeito à sua integridade física e moral.
Além da legislação nacional, a utilização arbitrária de algemas fere importantes tratados assinados pelo Brasil como a Declaração Universal dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas, o Pacto de San José da Costa Rica, a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, entre outros, por proibirem o tratamento indigno do preso, seu constrangimento ou antecipação de pena.
Em havendo exorbitância na utilização da pulseira de ferro (algema), restará caracterizado o crime de abuso de autoridade quando submeter pessoa sob sua guarda ou custódia da autoridade a vexame ou constrangimento, lei (artigo 4º, letra "b" da Lei nº 4.898/65) e atentado contra a incolumidade física do indivíduo (artigo 3º, letra "i" da referida Lei).
A lei nº. 4.898/65 prevê as condutas tipificadas como abuso de autoridade.
Art. 3º Constitui abuso de autoridade qualquer atentado:
(...)
i) à incolumidade física do indivíduo;
(...)
Art. 4º
i) prolongar a execução de prisão temporária, de pena ou de medida de segurança, deixando de expedir em tempo oportuno ou de cumprir imediatamente ordem de liberdade.
(...)
Devendo ainda, ser destacado que a Constituição Federal acolheu a responsabilidade objetiva de qualquer dos Poderes no seu (Capítulo VII – Da Administração Pública) – em seu artigo 37, parágrafo 6º.
Artigo 37 – A administração pública direta e indiretamente de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
(...)
§ 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa;
(...)
Desta forma se o agente público, no exercício de suas funções, praticar ato ilícito, causando dano por dolo ou culpa a alguém, é direito deste pleitear a justa indenização.
REFERÊNCIAS:
MOREIRA, Rômulo de Andrade. Algemas para quem precisa. Jus Navegandi, Teresina, a. 10, n. 924, 13 jan. 2006;
GOMES, Rodrigo Carneiro. Regra, e não exceção – uso de algemas garante integridade do policial e acusado. Consultor Jurídico. 11 fev. 2006;
GOMES, Luiz Flávio. O uso de algemas em nosso país está devidamente disciplinado? Jus Navigandi, Teresina, ª 6, n. 56, abr. 2002;
ANDREUCCI, Ricardo Antônio. Curso de Direito Penal. 1ª Edição, São Paulo, Editora Juarez de Oliveira, 1999, v.1.
XAVIER, Maria Corrêa. Dignidade do preso com algemas;
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Inspetor Frederico