Autor: Prof. João Alexandre Santos
Tenho recebido diversos e-mails e
sou costumeiramente indagado em minhas aulas, seminários e congressos aos quais
frequento, sobre esse tal “Marco Regulatório das Guardas Municipais
(MRGM)”. Obviamente eu tenho
meu entendimento particular, que destoa em alguns pontos e converge em outros,
mas quem somos nós para sermos consultados? Há um desencontro de informações
muito grande, uma alienação geral sobre essa ideia como um todo, fruto da
ausência de um debate coletivo nacional.
São muitos fatos e detalhes que
as pessoas replicam sobre o MRGM simplesmente por ouvir dizer, e esse processo é
muito ruim por que alimenta fatos e boatos que geram objeções desnecessárias, que
mais atrapalham do que ajudam nesse processo de caminhada rumo a construção de
uma norma eficaz para o seguimento. Por vezes, tenho repetido que essas
indagações nascem do profundo desconhecimento da maioria dos guardas municipais
e até de comandantes que foram excluídos do processo de discussão sobre o que
de fato esse novo regramento alterará na vida dos servidores e na natureza e
peculiaridade de seus serviços. Quais são os prós e os contras
do texto? E em tempo ... qual texto? Quem leu, quem viu?
Antes de tecer os comentários
pertinentes ao tema, quero aqui deixar público que tenho profundo respeito pela
forma de ser, agir e pensar dos mentores desse processo como um todo. Afinal estamos numa democracia e a
liberdade de expressão e pensamento são garantidos
em leis. São estes mentores, personalidades públicas que todos conhecem e o
juízo de valor aqui tecido não se refere à pessoa humana dos mesmos, até porque
não os conheço e nem desfruto de qualquer ciclo próximo a eles. Mas como atores
que são do sistema ao qual estamos inseridos, alguns detalhamentos devem ser
postos a fim de que o processo democrático seja exercido em sua plenitude.
É fato que as Guardas Municipais
estão se multiplicando de maneira rápida e muitas delas, nascem com estruturas jurídicas,
estruturais, filosóficas e humanas totalmente distantes daquilo que o
Comandante Cruz (GM Vinhedo) coloca tão brilhantemente em sua fala, que é a de polícia contemporânea. Algumas
caminharam para o efetivo policiamento repressivo e de preservação da ordem
pública (causando ai entendimentos diversos), outras ficaram na interpretação
positivista do texto constitucional que seria a de vigilância ou guarda
de bens, serviços e instalações e outras nem lá nem cá. Nessa seara, há interesses diversos em jogo,
questões de ordem constitucional, corporativismos, projeção política pessoal e
não nos esqueçamos da reserva de mercado nos serviços de segurança pública.
Algumas dessas autoridades falam
que a guarda municipal deve ser policia de costumes, polícia
de posturas, polícia de ordenamento
do espaço urbano, trazem para o mundo da discussão questões como a de
que as guardas municipais fazem segurança urbana e não segurança
pública enfim, as teorias estão nascendo e devem ser submetidas aos
experimentos para que haja certeza de sua aplicabilidade no mundo real.
O que de fato vejo e isso precisa vir a ser
escancarado para que todos os guardas municipais, comandantes, gestores e
comunidade acadêmica venham a entender claramente, é se o MRGM ao criar os
conceitos jurídicos como “órgão complementar”, “policias
municipais preventivas e comunitárias” e principalmente “não
considerar como Guarda Municipal aquelas que tenham menos que 50 integrantes”, buscam
inovar ou tirar as Guardas de vez do cenário de atuação em que se encontram. São
diversos pontos que precisam de aprofundamento para que isso não venha matar na
raiz alguns excelentes serviços que a maioria das guardas municipais prestam à
população e ao país. Não seria interessante a discussão disso feita por regiões?
Não se poderia programar debates e audiências públicas nas capitais convidando
presidentes de associações, sindicatos, comandantes e gestores? Se a SENASP em
conjunto com o Conselho Nacional das Guardas Municipais (CNGM) Fizessem um
planejamento em 12 meses, todos os Estados de nosso País seriam ouvidos.
Poderia ser distribuídos formulários padrões de pesquisa, links no site da
SENASP/CNGM... etc? Nada que implicasse grandes investimentos e logísticas
complexas. Coisa simples! Por que não disponibilizar o texto proposto em PDF na
internet para que os comandantes lessem, refletissem e propusessem suas ideias
também. Enfim, democratizar o debate.
Gostaria muito de saber opiniões
do Norte, Nordeste, Oeste, Centro-Oeste, Sul do País. Será que só o Sudeste vai
ditar a regra? O que teria a dizer e propor os Sindicatos, e Associações de
Guardas de outros Estados? O que teria a dizer e propor os Comandantes Elvis,
Cruz, Frederico, Marcos Adriano, André Tavares e demais, quais as opiniões
deles que também são estudiosos? E dos Guardas Municipais do Brasil como um
todo? Por que os trabalhadores em Guardas Municipais, não estão legitimamente
representados nesse processo? Quem disse que o SINDGUARDAS/SP fala por todos os sindicatos e associações do
Brasil, quem o elegeu? Como ele chegou lá no GT? Quem o colocou lá? Como tomou
status de “Federação Nacional de Guardas Municipais” do dia pra noite? São
essas coisas que minam o processo de confiança na proposição deste MRGM. São
questões que eu ouvi, e aqui retransmito. Há uma insatisfação generalizada com
a forma que esses atores estão conduzindo o processo. Onde está o princípio da
publicidade dos atos públicos, uma vez que o GT é um serviço público em
andamento. Não questiono a capacidade intelectual ou política de qualquer dos
integrantes. São pessoas extremamente inteligentes e de notório saber. Porém
esse agrupamento restrito e limitado, que fechou a porta à pluralidade do
debate, vai encontrar resistências mais adiante. Não é bom subestimar a
capacidade dos demais atores que ficaram à margem do processo. Nós iremos
debater mais sobre isso nos artigos seguintes; mas aqui fica, esse alerta
pedagógico a esses intelectuais do MRGM, tentando mostrar-lhes que está havendo
uma não conformidade nesse processo todo. Que está na hora de estender o
diálogo, de sanar as dúvidas da base e dizer de vez, que não há um canto de
sereia e que a embarcação pode seguir tranquilamente rumo à busca de identidade
e de valorização profissional.
PROF. JOÃO ALEXANDRE SANTOS. Professor, pesquisador e especialista em Segurança Pública, Direitos Humanos e
Ciências Policiais. Coordenador do Centro de Estudos em Segurança Pública e
Direitos Humanos - CESDH, do Fórum Permanente de Segurança Pública do Estado de
São Paulo (FPSP/MAS) e do Centro de Estudos Avançado em Problemas
Sociais (CEAPS-SP). Membro Associado ao Instituto Brasileiro de
Ciências Criminais - (IBCCRIM) e da International Police Association
(IPA/SP). Coordenador Acadêmico da Escola de Formação de Comandantes de
Guardas Municipais e Gestores de Segurança Pública Municipal do CESDH/SP.
Diretor Adjunto de Assuntos de Segurança Pública e Direitos Humanos do
Escritório Pereira Leutério Advogados Associados.
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