08 abril 2012

MARCO REGULATÓRIO DAS GUARDAS MUNICIPAIS: HÁ REALMENTE UM CANTO DE SEREIA NESSE PROCESSO?


Autor: Prof. João Alexandre Santos 
Tenho recebido diversos e-mails e sou costumeiramente indagado em minhas aulas, seminários e congressos aos quais frequento, sobre esse tal “Marco Regulatório das Guardas Municipais (MRGM)”. Obviamente eu tenho meu entendimento particular, que destoa em alguns pontos e converge em outros, mas quem somos nós para sermos consultados? Há um desencontro de informações muito grande, uma alienação geral sobre essa ideia como um todo, fruto da ausência de um debate coletivo nacional.
São muitos fatos e detalhes que as pessoas replicam sobre o MRGM simplesmente por ouvir dizer, e esse processo é muito ruim por que alimenta fatos e boatos que geram objeções desnecessárias, que mais atrapalham do que ajudam nesse processo de caminhada rumo a construção de uma norma eficaz para o seguimento. Por vezes, tenho repetido que essas indagações nascem do profundo desconhecimento da maioria dos guardas municipais e até de comandantes que foram excluídos do processo de discussão sobre o que de fato esse novo regramento alterará na vida dos servidores e na natureza e peculiaridade de seus serviços. Quais são os prós e os contras do texto? E em tempo ... qual texto? Quem leu, quem viu?
Antes de tecer os comentários pertinentes ao tema, quero aqui deixar público que tenho profundo respeito pela forma de ser, agir e pensar dos mentores desse processo como um todo. Afinal estamos numa democracia e a liberdade de expressão e pensamento são  garantidos em leis. São estes mentores, personalidades públicas que todos conhecem e o juízo de valor aqui tecido não se refere à pessoa humana dos mesmos, até porque não os conheço e nem desfruto de qualquer ciclo próximo a eles. Mas como atores que são do sistema ao qual estamos inseridos, alguns detalhamentos devem ser postos a fim de que o processo democrático seja exercido em sua plenitude.
É fato que as Guardas Municipais estão se multiplicando de maneira rápida e muitas delas, nascem com estruturas jurídicas, estruturais, filosóficas e humanas totalmente distantes daquilo que o Comandante Cruz (GM Vinhedo) coloca tão brilhantemente em sua fala, que é a de polícia contemporânea. Algumas caminharam para o efetivo policiamento repressivo e de preservação da ordem pública (causando ai entendimentos diversos), outras ficaram na interpretação positivista do texto constitucional que seria a de vigilância ou guarda de bens, serviços e instalações e outras nem lá nem cá. Nessa seara, há interesses diversos em jogo, questões de ordem constitucional, corporativismos, projeção política pessoal e não nos esqueçamos da reserva de mercado nos serviços de segurança pública.
Algumas dessas autoridades falam que a guarda municipal deve ser policia de costumes, polícia de posturas, polícia de ordenamento do espaço urbano, trazem para o mundo da discussão questões como a de que as guardas municipais fazem segurança urbana e não segurança pública enfim, as teorias estão nascendo e devem ser submetidas aos experimentos para que haja certeza de sua aplicabilidade no mundo real.
 O que de fato vejo e isso precisa vir a ser escancarado para que todos os guardas municipais, comandantes, gestores e comunidade acadêmica venham a entender claramente, é se o MRGM ao criar os conceitos jurídicos como “órgão complementar”, “policias municipais preventivas e comunitárias” e principalmente “não considerar como Guarda Municipal aquelas que tenham menos que 50 integrantes”, buscam inovar ou tirar as Guardas de vez do cenário de atuação em que se encontram. São diversos pontos que precisam de aprofundamento para que isso não venha matar na raiz alguns excelentes serviços que a maioria das guardas municipais prestam à população e ao país. Não seria interessante a discussão disso feita por regiões? Não se poderia programar debates e audiências públicas nas capitais convidando presidentes de associações, sindicatos, comandantes e gestores? Se a SENASP em conjunto com o Conselho Nacional das Guardas Municipais (CNGM) Fizessem um planejamento em 12 meses, todos os Estados de nosso País seriam ouvidos. Poderia ser distribuídos formulários padrões de pesquisa, links no site da SENASP/CNGM... etc? Nada que implicasse grandes investimentos e logísticas complexas. Coisa simples! Por que não disponibilizar o texto proposto em PDF na internet para que os comandantes lessem, refletissem e propusessem suas ideias também. Enfim, democratizar o debate.
Gostaria muito de saber opiniões do Norte, Nordeste, Oeste, Centro-Oeste, Sul do País. Será que só o Sudeste vai ditar a regra? O que teria a dizer e propor os Sindicatos, e Associações de Guardas de outros Estados? O que teria a dizer e propor os Comandantes Elvis, Cruz, Frederico, Marcos Adriano, André Tavares e demais, quais as opiniões deles que também são estudiosos? E dos Guardas Municipais do Brasil como um todo? Por que os trabalhadores em Guardas Municipais, não estão legitimamente representados nesse processo? Quem disse que o SINDGUARDAS/SP  fala por todos os sindicatos e associações do Brasil, quem o elegeu? Como ele chegou lá no GT? Quem o colocou lá? Como tomou status de “Federação Nacional de Guardas Municipais” do dia pra noite? São essas coisas que minam o processo de confiança na proposição deste MRGM. São questões que eu ouvi, e aqui retransmito. Há uma insatisfação generalizada com a forma que esses atores estão conduzindo o processo. Onde está o princípio da publicidade dos atos públicos, uma vez que o GT é um serviço público em andamento. Não questiono a capacidade intelectual ou política de qualquer dos integrantes. São pessoas extremamente inteligentes e de notório saber. Porém esse agrupamento restrito e limitado, que fechou a porta à pluralidade do debate, vai encontrar resistências mais adiante. Não é bom subestimar a capacidade dos demais atores que ficaram à margem do processo. Nós iremos debater mais sobre isso nos artigos seguintes; mas aqui fica, esse alerta pedagógico a esses intelectuais do MRGM, tentando mostrar-lhes que está havendo uma não conformidade nesse processo todo. Que está na hora de estender o diálogo, de sanar as dúvidas da base e dizer de vez, que não há um canto de sereia e que a embarcação pode seguir tranquilamente rumo à busca de identidade e de valorização profissional. 

PROF. JOÃO ALEXANDRE SANTOS. Professor, pesquisador e especialista em Segurança Pública, Direitos Humanos e Ciências Policiais. Coordenador do Centro de Estudos em Segurança Pública e Direitos Humanos - CESDH, do Fórum Permanente de Segurança Pública do Estado de São Paulo (FPSP/MAS) e do Centro de Estudos Avançado em Problemas Sociais  (CEAPS-SP). Membro Associado ao Instituto Brasileiro de Ciências Criminais - (IBCCRIM) e da International Police Association (IPA/SP). Coordenador Acadêmico da Escola de Formação de Comandantes de Guardas Municipais e Gestores de Segurança Pública Municipal do CESDH/SP. Diretor Adjunto de Assuntos de Segurança Pública e Direitos Humanos do Escritório Pereira Leutério Advogados Associados.

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